GATO
SOBREVIVENTE
Ao
jantar os filhos
perguntam
quanto tempo falta para o mundo acabar.
Os
filhos perguntam quanto tempo falta
para o
pai acabar. Perguntam
quanto
tempo lhes falta para acabarem.
Em
resposta faço-lhes o prato
com
vegetais e peixe e hidratos de imprecisão
dou-lhes
palavras que nunca mais acabam palavras
oleosas,
emaranhadas nas facas, nos garfos
que
deixam marca nos copos e nos guardanapos.
Digo-lhes
que se despachem
que já
falta pouco para fecharem os olhos
e poder
mergulhar em cada um dos peitos minúsculos
para
lhes polir o coração que nunca acaba.
Os
filhos perguntam qual é o rating da vida
perguntam
qual é o spread do amor
em que
clube joga o fmi
quando entrará
em erupção o primeiro-ministro
por que é
que os vulcões não pagam portagem
de que
lado ficam o máximo e o mínimo do oriente médio
se algum
dia as estrelas serão condenadas
por
trazerem cancro à alma dos meninos condenados
e que
investigador descobrirá uma cura a sério
ou que
cura descobrirá um investigador a sério, porque
os
filhos gostam de brincar com as palavras
que
nunca acabam. Perguntam se
algum
dia lhes comprarei as possibilidades
que
viram anunciadas no intervalo das certezas.
Ao
jantar os filhos perguntam se o destino também
é
corrupto, se aceita subornos.
Cercados
pela imagem de uma ambulância incandescente
debruçada
sobre um curioso gato que não morreu
os
filhos perguntam
despois
da morte o que há de sobremesa?
Renato
Filipe Cardoso
in “Aprendiz de Dourado”
Eduardo
Leal
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