O TOQUE
DO TELEMÓVEL
O toque
do telemóvel!
Aquela
voz que aguardei o dia inteiro,
o final
da expectativa que não havia meio de se escoar
pelos
interstícios das horas longas,
pesadas,
que se
sucediam em vão!
Já não
sei do que falámos,
mas as
palavras não importam
nem o
que elas queriam dizer.
O que
interessa é que se lembrou de mim,
que quis
falar-me,
que quis
ouvir-me,
ou
talvez certificar-se apenas de que vivo
e
continuo disponível para acatar o seu apelo.
Isto que
sinto, este bem-vindo alvoroço,
é com
certeza paixão!
E da
mais forte,
daquela
que se alimenta de pequenos nadas
que são
tudo,
e com os
quais se exalta,
e se eleva
acima das coisas e dos dias!
E das
palavras também,
que
algumas até são escorregadias como limos,
duras
como godos arredondados pela água
em marés
vivas,
e
ásperas como as paredes
que às
vezes se levantam entre nós,
tentando
a separação.
Mas há
pouco, o bendito telemóvel tocou.
Era já
noite.
Houve
aquele abalo de sempre, cá dentro
mas, de
imediato, o universo se recompôs,
as
estrelas começaram a piscar
e todos
os muros recuaram,
envergonhados!
Miguel
Leitão
in “Vento na Alma”
lido
por Cristina Pessoa
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