quarta-feira, 23 de outubro de 2013

MENINO DO BAIRRO DA LATA



MENINO DO BAIRRO DA LATA

Menino que me bate à porta
da alma.. triste e magoada,
dizendo que a mãe está morta;
menino chorando no passado!

Corria, que a mãe esperava
na cancela do bairro da lata!...
Abraçava-o nunca cansava,
mas na aula a hora é chata.

Dizia. Roubava-lhe tempo e ternura!
A mãe, tão querida, espera, é hora!...
Corre o menino louco pela rua
onde o destino cobra e mora!

Porém, de longe algo pressentia…
Que se passa? A mãe vai embora?
Não, a mãe ali mesmo caía!
E sofrendo o menino corre e chora.

Morreu na cancela, tão ansiosa,
sem ver o menino, sem um beijo sequer,
caiu como uma flor na terra arenosa,
sem nome, sem fala, apenas mulher!

Perguntei-lhe depois, ‘inda tão tristonho:
- e teu pai? Anda sempre a cair,
bebe muito vinho; meu irmão Tonho
anda sempre a correr pra lhe acudir!

E não tens mais ninguém? Uma irmã,
que sai todas as noites, a fazer não sei o quê!
E comida, quem é que a faz? Não há…
Só pasteis secos, que mais ninguém quer comer!

Que dão ao meu irmão lá,
Na confeitaria onde trabalha.
E sendo a única coisa que há,
Eu prefiro pedir, que melhor calha!

Meu filho, com síndrome de Down,
andava na mesma escola
e com ele fez amizade sem fraude
puro sentir que não cabe na sacola!

E trá-lo pela mão; mãe, leva,
roga: leva pra casa, eu não resistia!
E o menino passou a ser seu colega.
Chegava a casa, lavava-o e vestia.

Pra poder sentá-lo à mesa,
porque o aspecto era assustado,
passou a ser uma certeza
a sua presença no meu labor!

Até ao dia que acabaram
com o horripilante bairro da lata!
Então as gentes abalaram
E só a lembrança do menino me arrebata.

Maria de Lourdes Martins

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