A LEÃO
XIII
Ó Padre
Santo! Meu Irmão! Ó meu amigo
Do velho
mundo antigo
- Dá-me
consolação, e prova-me que há Deus;
Resolve-me
a equação estrelada dos céus;
Admite-me
ao Conselho amigo dos Cardeais:
Deixa-me
ler, também, na letra dos missais!
Muito
que te contar! Não conheces o mundo?
Nunca
desceste, Padre!, a esse poço profundo?
Metido
nessa cela ideal do Vaticano,
Há
quanto tempo tu não vês o Oceano?
Nunca
viste um bordel! Sabes o que é a desgraça?
Ouviste,
acaso, o "pschut"! delas, a quem passa?
Sabes
que existem, dize, as casas de penhores?
No teu
palácio, há, porventura, amores?
Viste
passar, acaso um bêbado, na rua?
Já viste
o efeito que na lama imprime a lua?
Ouve:
tiveste já torturas de dinheiro?
Já viste
um brigue no mar? Já viste um marinheiro?
Que
ideias fazes tu das crenças dos rapazes?
Já viste
alguém novo, Padre? Que ideia fazes,
Santo
Leão!, do Boulevard dos Italianos?
Recordas
com saudade os teus vinte e três anos?
Ó Leão
XIII! Ó Poeta, essa é a minha idade!
Como tu
vês, estou na flor da mocidade!
Ainda
não contei metade de cinquenta.
Começa-me
a nascer a barba, o mundo tenta
A minha
alma: ah, como é lindo esse Demónio!
Nasci em
Portugal. Chamo-me António;
Tenho
sido um infeliz...
Um vento
de desgraça atirou-me a Paris.
Em
pequenino, Padre, ajoelhado na cama,
A erguer
as mãos a Deus, ensinou-me a minha ama;
Sabia de
cor mil e trezentas orações,
Mas tudo
esqueci no mundo aos trambolhões...
Nossa
Senhora te dirá se isto é assim!
-O que
há-de ser de mim?
António
Nobre 1867-1900
lido
por Fernanda Cardoso
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