quarta-feira, 19 de junho de 2013

A MINHA CIDADE


A MINHA CIDADE

A minha cidade não se chama Lisboa,
não tem cheiro a sul
e nem por ela passa o Tejo
mas como ela, tem Nascentes
leitosos e marmóreos…
na minha cidade os Poentes são de ouro
sobre o Douro e o mar
e só ela tem a luz do entardecer
a enfeitar o granito…
na minha cidade, tal como em Lisboa
há gaivotas e maresia
mas não há cacilheiros no rio
há rabelos
transportando néctar e almas…
da minha cidade nasce o Norte
alcantilado, insubmisso
e o sol, quando chega, penetra-a
delicadamente, carinhosamente
depois de vencido o nevoeiro…
na minha cidade também há pregões
gatos, pombas, castanhas assadas e iscas
e fado pelas vielas, pendurado com molas
como roupa a secar nos arames…
a minha cidade tem também tarde languescentes
coretos nas praças
velhos jogando cartas em mesas de jardim
e o revivalismo de viúvas e solteironas
passeando de eléctrico…
é bem verdade que na minha cidade
a luz, não é como a de Lisboa
mas a luz da minha cidade
é um frémito de amor do astro rei
a beijá-la na fronte, cada manhã!

Maria Mamede
in: “Da Água Toda”

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